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Close | A maior representação de como a infância é frágil

Já é março, o mês que ocorre a 95º edição do Oscar, a maior premiação do cinema. O mês também é marcado por filmes independentes e de pouca expressão que chegam aos cinemas brasileiros, sobretudo àqueles que tiveram seus nomes cravados na lista final de indicados ao Oscar 2023, como é o caso de Close, filme dramático belga coproduzido com França e Países Baixos, indicado na categoria de ‘Melhor Filme Estrangeiro‘, um dos vários produtos do aclamado estúdio A24.

Dirigido e escrito por Lukas Dhont – em parceria com Angelo Tijssens no roteiro -, Close conta a história de uma amizade muito especial de Leo (Eden Dambrine) e Rémi (Gustav de Waele), duas crianças de 13 anos que praticamente cresceram juntos. Com uma relação muito próxima entre os dois, a amizade tão forte teve que ser parada com a chegada do ano letivo escolar e com o bullying sobre as interações muito afetuosas que Rémi e Leo trocavam. Porém, a mudança de postura da amizade dos dois garotos acarreta uma série de desvios que ninguém jamais esperava acontecer, virando todas as suas vidas de cabeça para baixo.

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Cartaz de Close. (Foto: Reprodução/ Twitter)

A estreia do filme ocorreu no Festival de Cinema de Cannes em 26 de maio de 2022, recebendo aclamação da crítica e levando o Grand Prix, prêmio entregue e votado pelo júri de Cannes. O diretor, Lukas Dhont, inclusive, já é familiarizado com o festival, já vencendo o principal prêmio da noite, a Palma de Ouro, com a produção “Girl” (2018). Close foi lançado pela distribuidora Diaphana Distribution na França – em 1º de novembro de 2022 – e pela Lumiere em Benelux – em 2 de novembro – e foi exibido no Festival do Rio de 2022.

A Nerds da Galáxia teve a oportunidade de ver antecipadamente Close no CineSesc, no dia 15 de fevereiro. Agora, com sua estreia nacional acontecendo nesta quinta-feira (2), confira nossa crítica detalhada abaixo – claro que sem nenhum spoiler.

NotaEstá é uma crítica sem spoilers, a fim de não estragar sua experiência em assistir o filme. A crítica consiste em uma opinião do escritor e não deve ser considerada absoluta ou uma resposta definitiva para a sua dúvida de assistir o filme ou não, tampouco um achismo absoluto do portal Nerds da Galáxia. Sempre priorize ver para estimular o trabalho dos realizadores. As informações contidas na crítica já foram apresentadas em sinopses e trailers.

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Pôster de Close. (Foto: Reprodução/ AdoroCinema)

O contexto de Close

O que define uma amizade próxima ou uma “normal”? Bem, caso tenha uma resposta a essa pergunta, com certeza não será um senso comum. Porém, uma falta de resposta para o questionamento acima foi o ponto determinante para a trama de Close.

O nome do filme não foi escolhido pelo charme ou pela babação de ovo que hoje temos em incluir nomes estrangeiros no vocabulário: ao mesmo tempo que close quer dizer “perto” ou “próximo” – um grande exemplo é a aba de ‘Close Friends’ do Instagram, ou ‘Melhores Amigos” -, também representa o significado de “fechar”, “encerrar” e “terminar” – como, infelizmente, acontece com a relação de Rémi e Léo no longa, pelo julgamento e olhares dos outros e a incessante postura de se adequar a um grupo, piorada ainda mais quando relembramos que os protagonistas são adolescentes em meio à escola, uma das piores fases da vida: quando somos apresentados ao começo da vida adulta cheio de maturidades e falsas ideias de amadurecimento.

Close está presente no excelente trabalho de fotografia e direção comandadas pelo cineasta Lukas Dhont. Nos momentos iniciais do filme, câmeras mais fechadas focam nos momentos coloridos e cheios de alegria e energia de Léo e Rémi, que correspondem a todo ínicio do longa. Afinal, os dois adolescentes são inseparáveis, com Léo sempre durmindo na casa de Rémi e a família de seu melhor amigo quase que adotando-o como se fosse membro dessa união.

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Cena de Close. (Foto: Reprodução/ YouTube)

É na chegada do período escolar que a rotina dos dois mudam por completo. Planos mais distantes são escolhidos para simbolizar a complexidade que uma escola representa na vida dos estudantes, como se fosse um mundo à parte – a medida que avançamos de ano no colégio, mais pesados são os comprometimentos, afazeres e regras, sem mencionar todo o jogo psicológico de socializar e pertencer a um grupo – além de adiantar um novo direcionamento que a trama terá daqui para frente.

Confrontado pelos seus colegas de escola se Léo e Rémi são um casal é que faz Léo surtar e decidir unilateralmente se afastar de Rémi, também incluindo no pacote a extinção dos carinhos que ambos trocavam e o ‘grude’. Assim como mexeu com Léo, a ideia afeta muito Rémi. Uma valorização do que os outros pensam fez com que suas vidas mudassem para sempre.

A partir das ações que desencadeam em Close, os protagonistas passam um processo precoce de como lidar e como se portar perante o acontecido, deixando um ritmo lento a história, mas também muito rica, captando praticamente todo o processo do luto e da “virada de página”.

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Cena de Close. (Foto: Reprodução/ YouTube)

Close e sua importância

O filme belga traz vários questionamentos sobre algumas atitudes falhas da nossa sociedade, que são muito pertinentes. Com o recente debate da saúde mental, da pauta LGBTQIAP+ e da atitude de nos expressarmos mais nossos sentimentos, ainda há um grande despreparo dos pais e de todos os responsáveis sobre como falar disso ao filho, de como resolver o assunto; assim como das entidades.

Primeiro, podemos debater sobre a homofobia. O estereótipo de uma relação mais íntima e carinhosa entre dois homens (que poderiam facilmente entre duas mulheres, mas com os homens este tabu é muito mais pegado) sempre se voltar ao questionamento se são um casal ou não é fortemente presente. Entre os diversos malefícios que isso pode causar, uma delas é vista em Close e tem a ver com outro estereótipo: homem não pode demonstrar sentimento ou fraqueza.

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Cena de Close. (Foto: Reprodução/ YouTube)

Close foi assertivo em mostrar as crianças coadjuvantes/ figurantes sem a figura extrema da homofobia, como violentas, repressivas ou odiosas. Logo, essa pergunta sobre se Rémi e Léo são um casal, feita pelos colegas de classe, vem de uma ingenuidade provida de uma repleta ignorância sobre homens serem amorosos com outros homens, fugindo da “faceta de homem”. E é uma ignorância dado à falta de ensino dos pais daquelas crianças sobre aceitação e visão das ‘diferenças’ e sobre o verdadeiro significado de amor e suas formas. Assim como o ensino de uma rotulação da figura masculina, parecendo até um manual de instrução.

Por falar em rotulação, foi muito coerente à proposta a não-definição de que tipo de relacionamento Rémi e Léo tem. Só corrobora e normaliza uma relação de amizade mais afetuosa entre dois homens, mesma coisa com um relacionamento mais amoroso/ sexual também. Além de que, em termos narrativos, joga para o telespectador a sua definição e compreensão, um recurso bem difícil de ser inserido nas longas-metragens.

Por último, vamos incluir o tema ‘Educação’ para destrinchar outros subtemas. O diretor Lukas Dhont convida indiretamente uma polêmica opinião de ensinar as crianças desde cedo aos diferentes tipos de relação que se têm no mundo, além da saúde mental e do espaço seguro para a criança conseguir desabafar sobre o que está lhe afetando.

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Cena de Close. (Foto: Reprodução/ YouTube)

Cenas de uma sessão de acompanhamento terapêutico e pedagógico promovida na escola de Rémi e Léo em Close são exemplos de como isso deve ser pautado para os adolescentes, que estão em constante fase de dúvidas e de aprendizado. Se eles aprendem conhecimentos das mais diversas áras dos saberes, como Idiomas, Ciências exatas, Ciências Humanas e afins, por que os campos da saúde mental, relações e outros também não podem ser discutidos?

Sabemos que uma mudança drástica e um momento péssimo em nossas vidas são o suficiente para um turbilhão de sentimentos ruins. Se isso já nos afeta consideravelmente e muitas das vezes nem os adultos conseguindo controlar/ resolver isso sozinho, imagina para uma criança e para um adolescente? É piorado em múltiplas vezes.

Até a própria autovalorização, como lidar com o outro e com as complicações da vida e a nossa necessidade primitiva de agradar a maioria são temas postos com frequência. Léo, apesar de internamente ser o mesmo, se torna uma outra pessoa, até como forma de fugir do passado, se encaixando no time de hóquei (detalhe muito bem colocado pelos roteiristas Lukas e Angelo, por ser um esporte de muito contato físico, com Léo sofrendo muitas pancadas como uma forma de se martirizar e amadurecer).

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Cena de Close. (Foto: Reprodução/ YouTube)

Pontos finais

Close é uma verdadeira aula de como somos moldados pelo ambiente que nos cerca, começando desde muito cedo, nos nossos primeiros passos da vida: com nossa edcuação recebida dentro de casa e dos ensinamentos sociais nas instituições de ensino, um outro grande universo totalmente diferente.

Eden Dambrine, Gustav De Waele e Émilie Dequenne (atriz belga ganhadora de ‘Melhor Atriz’ no Festival de Cannes por seu trabalho em “Rosetta”, filme vencedor da Palma de Ouro de 1999) como Léo, Rémi e e Sophie – mãe de Rémi -, respectivamente, são excepcionais e cruciais para o movimento da trama, trazendo muita fidelidade e riqueza na narrativa de Close.

Apesar de em determinadas ocasiões parecer lento e inconstante, Close retrata fielmente o processo da aceitação do erro e de sua compreensão. Se prepare para muitos choros e verdades na cara, de uma maneira tocante, orgânica e linda, tanto historicamente quanto esteticamente, na natureza linda dos Países Baixos.

Close (2023)

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